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Negociação coletiva é instrumento de luta contra a desigualdade salarial

02 Dec 2024 790 VISUALIZAÇÕES

Historicamente, a presença da mulher no mercado de trabalho tem sido marcada pela desigualdade que se reflete em vários aspectos como dificuldade de ascensão profissional, de carreira, a falta de equiparação salarial, além dos obstáculos na própria inserção nesse mercado. Tudo isso faz com que as mulheres sejam maioria entre a população desempregada, tenham sempre a maior taxa de desocupação e os vínculos mais vulneráveis.

Na questão de rendimentos, o segundo relatório Transparência Salarial e Critérios Remuneratórios, divulgado em setembro de 2024, mostrou que as mulheres ainda recebem 20,7% menos do que os homens nas 50.692 empresas com 100 ou mais empregados que forneceram os dados para a elaboração do estudo.

A média salarial dos homens é de R$ 4.495,39, enquanto a das mulheres é de R$ 3.565,48. A disparidade é ainda mais acentuada entre mulheres negras, que ganham, em média, R$ 2.745,26 — apenas 50,2% do salário de homens não negros.

No que se refere à formação, elas são a maioria no mercado de trabalho com curso superior, no entanto, ainda recebem salários menores que homens que atuam com os mesmos cargos. Elas ocupam poucos cargos de liderança, precisam trabalhar menos horas para dividir a rotina profissional com a doméstica e têm dificuldade para atuar em múltiplas jornadas – a profissional, a de formação e à da vida doméstica, já que no Brasil, ainda é relegada a elas a responsabilidade da casa e dos trabalhos de cuidados.

Tal realidade é retrato de uma das violências mais comuns cometidas contra as mulheres. Violência que se pratica não apenas pela disparidade salarial, mas também por meio de assédio sexual, moral e pressão por parte de colegas de trabalho homens.

O tema faz parte dos debates e atividades realizadas no período dos 21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra a Mulher, campanha mundial que no Brasil começa no 20 de novembro, Dia da Consciência Negra, já que as mulheres negras são as mais impactadas pelos diversos tipos de violência cometidos contra elas.

“A luta por igualdade passa por várias lutas”, diz a vice-presidenta da CUT e presidenta da Confederação Nacional dos Trabalhadores no Ramo Financeiro (Contraf-CUT), Juvandia Moreira. E entre elas, diz a dirigente, está a luta pela igualdade salarial.

Juvandia cita as relações compartilhadas, a luta para garantir creche, as políticas para cuidados para os pais, para os idosos, responsabilidades que hoje ainda acabam sendo da mulher, como obstáculos que impedem que elas acessem ou se mantenham no mercado de trabalho.

“Portanto, essa luta se faz através da legislação, do Estado promovendo [direitos], como foi o caso da Lei de Igualdade salarial, e através da negociação coletiva e da organização da mulheres e da sociedade para construir essa igualdade, mudando esse modelo de sociedade patriarcal, machista, combatendo esse machismo, compartilhando as relações no dia-a-dia, as tarefas, as responsabilidades com os filhos”, diz Juvandia.

“É uma conscientização da sociedade como um todo. É um processo de luta de muita organização”, pontua a vice-presidente da CUT.

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A violência da disparidade salarial

“Esse tipo de violência gera outras violências, outras desigualdades na vida cotidiana, social e doméstica das mulheres. Com menos autonomia, elas ficam mais suscetíveis, por exemplo, à opressão econômica de seus parceiros. Gera o empobrecimento, a vulnerabilidade, a submissão a seus parceiros”, diz a secretária da Mulher Trabalhadora da CUT, Amanda Corcino.

Segundo estudo da Oxfam, “a desigualdade de gênero reforça uma situação de violência, que pode ser física, sexual, psicológica, social, patrimonial ou moral. Muitas vezes, as mulheres não encontram apoio social ou do Estado para desfazer esse ciclo”.

No entanto, uma das conquistas recentes na luta das mulheres por respeito e dignidade na sociedade, celebrada nesses 21 dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra a Mulher, é a Lei 14.611/2023 que dispõe sobre a igualdade salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens e determina que a igualdade salarial para a realização de trabalho de igual valor ou no exercício da mesma função é obrigatória.

A Lei também define mecanismos para promover a transparência e a fiscalização sobre a igualdade salarial entre homens e mulheres.

Em vigor desde 3 de julho de 2023, teve seu decreto de regulamentação promulgado em 23 de novembro do mesmo ano. Um dos desdobramentos da lei foi o primeiro Relatório de Transparência Salarial, divulgado em 25 de março deste ano, por isso, o primeiro semestre de 2024 foi, de fato o período quando os principais dispositivos previstos na Lei de Igualdade Salarial tiveram início.

Neste contexto, a atuação da CUT e do movimento sindical no que se refere à negociação coletiva de trabalho é fundamental para reforçar ou ampliar os dispositivos previstos em Lei e promover efetivamente a igualdade salarial entre homens e mulheres.

“Estamos trabalhando nisso na CUT, organizando nossas mulheres para que possamos ter a efetivação da Lei, para que, de fato, seja uma realidade em nossas vidas”, diz Amanda Corcino.

O caminho, ela explica, é levar o tema para as mesas de negociação, e a partir do que determina a Lei, avançar em dispositivos de promoção da igualdade no mercado de trabalho.

“Estamos levando esse tema para as negociações para inserir, nos acordos e convenções coletivas, cláusulas que garantam não só a igualdade salarial, mas também a igualdade de gênero, de oportunidades, de combate à violência e ao assédio não só no mundo do trabalho mas também no que se refere à violência doméstica”, ela afirma.

Algumas categorias, inclusive, tem iniciativas exitosas de proteção à mulher, como o caso do Projeto Basta, Não Irão nos Calar, criado pelo movimento sindical bancário que oferece proteção e acolhimentos às vítimas de violência.

Ainda no âmbito das negociações, o movimento sindical cobra das empresas o desenvolvimento de campanhas educativas para eliminar o machismo, a misoginia e a violência contra as mulheres. Amanda reforça que apesar de a Lei estar em vigor, a luta ainda é constante para que a igualdade seja uma realidade no país.

Ela reforça ainda que é fundamental para que essas negociações resultem em avanços para as mulheres, ter uma maior representação nas mesas.

“Para que tenhamos essa implementação das cláusulas e que o tema seja permanente nas negociações, tem que ter maior participação das mulheres, tem que ter paridade. Algumas categorias como a bancária, os Correios, entre outras,  já conseguiram estabelecer esses avanços em suas convenções e acordos”, afirma a dirigente.

Balanço das negociações

Um levantamento feito pelo DIEESE no Sistema Mediador do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), considerando as negociações do primeiro semestre de 2024, mostrou que  foram incluídas 63 cláusulas que citam a Lei 14.611/2023, conhecida como Lei de Igualdade Salarial entre Homens e Mulheres em negociações coletivas esse ano.

No entanto, o Dieese reforça que além das cláusulas que expressam diretamente a Lei da igualdade salarial, há diversas outras que são negociadas pelas entidades sindicais com o objetivo de eliminar a desigualdades ente homens e mulheres no local de trabalho.

Categorias

Abaixo, o Portal da CUT destaca algumas das categorias cujas negociações coletivas resultaram em cláusulas específicas em relação à igualdade salarial e ao combate à violência contra a mulher.

  • Bancários
  • Correios
  • Atacadista e varejista;
  • Cooperativa de crédito;
  • Alimentação;
  • Calçado;
  • Química e farmacêutica;
  • Agricultura e pecuária;
  • Agentes autônomos do comércio;
  • Categoria diferenciada (secretárias);
  • Comunicações, publicidade e empresas jornalísticas;
  • Prestação de serviços a terceiros;
  • Turismo e hospitalidade
  • Vestuário.

Fonte: CUT