Choveu muito durante a maior parte do ato que movimentos sociais promoveram nesta sexta-feira (13), na Avenida Paulista. Mas o destaque mesmo foi o mar de gente que partiu do coração financeiro da cidade até a Praça da República, no centro.
Para a organização do ato eram 100 mil pessoas. Segundo a PM, apenas 12 mil. Nada melhor, portanto, do que você ver esse vídeo e tirar suas próprias conclusões. Certo mesmo é que entre o início e o fim da manifestação, a marcha demorava exatas 1h20 para passar e trazer bandeiras de várias cores: vermelhas, brancas, negras, multicoloridas do movimento LGBT e, claro, a bandeira do Brasil.
Afinal, uma manifestação que prega a democracia não pode escolher com qual roupa as pessoas devem ir.
Por volta das 18h, com a República cheia de gente e de água, algumas das lideranças dos movimentos fizeram um balanço de uma manifestação que terminou com a execução do Hino Nacional brasileiro e mostrou que o país não tem um único dono, muito menos nossos símbolos.
Para a CUT, a mobilização cumpriu o papel. Por um lado, deixou claro à presidenta Dilma que governar ouvindo o povo, e não apenas o Congresso, não é opcional. Por outro, que a democracia é um valor inestimável para os movimentos sociais.
“Os movimentos e, em especial, a CUT, demonstraram a capacidade de mobilização, de intervenção na conjuntura e de trazer pessoas para defender os seus direitos. A Central deu o recado de que agora precisa acabar o processo de terceiro turno para que a presidenta Dilma possa governar. Mas que governe ouvindo o povo, colocando em prática a agenda que ganhou as eleições. Temos que ter a valorização da negociação e do diálogo no país e o entendimento que o desenvolvimento só virá com melhores condições de vida e emprego para o trabalhador”, afirmou o presidente nacional da CUT, Vagner Freitas.
Nas ruas desde a ditadura
Para o secretário-geral da CUT, Sérgio Nobre, os trabalhadores não permitirão que a luta de milhares pela democratização do país escorra pelo ralo da intolerância.
“Se esse país conquistou a democracia foi por conta da classe trabalhadora. Muitas pessoas perderam a vida por isso e sob hipótese alguma a classe trabalhadora vai permitir retrocesso. O recado está dado e agora é continuar as lutas por nossos direitos no Congresso Nacional”, disse.
Para o presidente da Confederação Sindical Internacional (CSI), João Felício, a reação que se manifesta em forma de tentativa de golpe retrata também interesses econômicos internacionais e unificados. A saída, define, deve ser sempre à esquerda.
“Todas as vezes em que se elege um governo do campo democrático e popular, os reacionários e golpistas se unificam para tentar derrubar. Já tentaram fazer isso na Venezuela, no Chile e estão tentando fazer isso na Argentina. Mas aqui não permitiremos. Porém, o governo precisa mudar alguns ministros neoliberais que nunca tiveram compromisso com a classe trabalhadora e derrubar as Medidas Provisórias (664 e 665) é um bom começo. Para o ajuste fiscal é preciso taxar as grandes fortunas”, propõe.
Petrobrás e os ataques
Segundo o secretário de Relações Internacionais da FUP (Federação Única dos Petroleiros), João Moraes, a hora é de mostrar quem realmente é a Petrobrás.
Para ele, a melhor forma de reverter a imagem negativa da empresa é o povo ir às ruas como fez em defesa da criação da estatal.
“Em 2014, a Petrobrás se tornou a maior produtora de petróleo com capital aberto do mundo, recebeu pela terceira vez o prêmio Nobel da indústria do petróleo, bateu recordes no refino, aumentou em 20% a produção de etanol e, em 8 anos, começou a produzir o pré-sal, enquanto outras petroleiras levam 15 anos. Não fosse o bloqueio dos grandes meios de comunicação, hoje o povo brasileiro teria orgulho da Petrobrás e cobraria, sim, a solução dos problemas, mas teria noção de que são muito pequenos diante da grandeza da Petrobrás”, definiu.
Juventude nas ruas…
Presidenta da UNE (União Nacional dos Estudantes), Vitória Barros, a Vic, avalia que a mobilização popular provou novamente a disposição para defender a democracia brasileira, a educação, a Petrobras e a reforma política. E é só o começo.
“Em abril, vamos fazer uma jornada de lutas em defesa de nossas pautas, como a desmilitarização da PM, o fim do extermínio da juventude negra, a reforma agrária e a reforma política para acabar com o financiamento empresarial para campanhas. Estamos nas ruas e estamos vencendo”, avaliou.
Militante do Levante Popular da Juventude, Pedro Freitas, lembrou que o crescimento na participação da juventude nas ruas, desde junho de 2013, que culminou na revogação do reajuste da tarifa de transporte público em diferentes capitais do Brasil.
“Queremos uma reforma do sistema político através de uma constituinte exclusiva e soberana, que permitirá romper com o cerco político que as forças da direita estão fazendo ao governo federal com o apoio da grande mídia. E não queremos ajustes fiscais que penalizam os jovens, como faz as Medidas Provisórias (664 e 665), que dificultam o acesso ao seguro-desemprego num cenário em que a rotatividade atinge principalmente a nossa geração”.
Presidenta da UEE (União Estadual dos Estudantes de São Paulo), Carina Vitral, a mobilização é essencial para impedir corte em programas voltados à educação como o Prouni (Programa Universidade para Todos), o Fies (Fundo de Financiamento Estudantil) e as cotas nas universidades federais.
“Os royalties do petróleo devem ser destinados para a educação e os 10% do PIB (Produto Interno Bruto) precisam ser cumpridos. Por isso, nenhum corte e nenhum direito a menos”, cobrou.
…e o campo também
Dirigente do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), João Paulo Rodrigues destaca que, apesar de o governo manter uma dívida com a reforma agrária, o caminho não é o golpismo.
“Estamos nas ruas há 30 anos e não há 30 dias e vamos continuar defendo os interesses do povo brasileiro nas ruas e ocupações de terra e não aceitaremos retrocesso na democracia e nos direitos sociais”, frisou.
Para além da luta em si, a coordenadora do MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens), Liciane Andrioli, ressaltou o aspecto formador de uma ação gigantesca.
“Vivemos num contexto de acirramento da direita e de uma mídia manipuladora e é preciso sair às ruas pra discutir com a sociedade as nossas bandeiras de luta. Nosso movimento de hoje é diferente do que será o outro daqui dois dias, que representa uma burguesia raivosa que quer vender a Petrobras para os norte-americanos e quer retrocesso de direitos da classe trabalhadora e desmoralizar os movimentos”, salientou.
No final de semana, as mobilizações mudam de foco, algo que não faz muito sentido para a maior parte do mundo. Prova disso é que, no final da noite, o diretor executivo da CUT Júlio Turra concedeu uma entrevista a uma jornalista russa que lançou a seguinte pergunta.
“Por que só passaram 70 dias das eleições e o povo brasileiro quer tirar a presidenta?”, disse. Depois desta sexta, ela já sabe que não é exatamente dos interesses do povo brasileiro que se trata.